Hoje voltei naquele quarto de adolescência dentro de mim. Aquele lugar onde eu escrevia com pressa de existir, onde cada palavra era de certa forma um grito mudo pedindo espaço. Lembro da menina que eu era encantada com o aprendizado da vida, mas cheia de histórias por dentro. Ela escrevia como se o mundo fosse acabar a qualquer momento. E de certa forma, muitos dos seus “mundos” acabaram mesmo, mas outros nasceram.
Eu cresci.
Formei uma família. Conheci Felipe meu
amor sereno, meu par, minha metade. Adotamos quatro crianças, e depois chegaram
os trigêmeos. A casa virou um redemoinho de risos, choros e pequenas mãos. Foi
o tempo mais cheio de vida que já vivi. E mesmo assim, ele se foi. Uma
apendicite. Simples, cruel, inesperada.
Quando
Felipe partiu, eu desmoronei por dentro, mas continuei de pé por fora. Ninguém
sabia a quantidade de noites em que chorei tentando não fazer barulho. Ninguém
sabia o quanto me doía sorrir para os meus filhos enquanto tudo em mim ainda
despencava.
Meus sogros,
a quem chamo de pai e mãe também me ajudaram a respirar. Me disseram que a vida
continuava. Eu não queria admitir.
Depois de
tanto refletir segui.
E um longo
tempo depois, alguém apareceu. Alguém que me olhou com paciência e não tentou
ocupar o lugar de Felipe só quis me ver
florescer de novo, de outro jeito. Eu resisti. Mas, no fim, aceitei. Porque
amar novamente não é trair o que passou. É honrar o que continua vivo em nós.
Segui em
frente, não por força, mas por fé. Troquei a fisioterapia pela medicina. Virei
pediatra. Talvez porque cuidar de crianças seja minha forma de lembrar do que é
puro, de reencontrar cada um dos meus filhos, e a mim mesma. Criei um centro
para crianças e idosos. Vivo correndo entre plantões e responsabilidades. Vivo
cansada. Mas viva.
Hoje, voltei
ao blog. Ao diário. Ao lugar onde tudo começou. Não sei quem vai ler. Talvez
ninguém. Mas escrever é a forma mais sincera que tenho de existir.
E se eu
pudesse encontrar aquela menina que escrevia escondida, eu diria: Você vai
passar por muitas coisas, mas vai sobreviver. E mais do que isso vai florescer
em lugares que nem sabia que existiam em você.
Ela ficaria
orgulhosa de mim.
E hoje, pela
primeira vez em muito tempo, eu também fico Euzinha.
Olá, querida amiga Fernanda!
ResponderExcluirtemos muitos pontos em comum.
"Ninguém sabia a quantidade de noites em que chorei tentando não fazer barulho."
O mesmo se sucedeu comigo e foi um sofrimento que ainda não teve fim de todo.
Ser abandonada pelo amor da nossa vida numa pandemia cruel é terrível. Uma dor dilacerante. Fiquei destruída.
Aos poucos, Deus vai nos consolando para uma dor que ficará para sempre sem extinção...
Também eu me debruço sobre as palavras pois ela tem mais paciência do que as pessoas.
"Escrever é a forma mais sincera que tenho de existir."
Vamos engolindo o choro como em criança quando a mãe ralhava pelo estado de nervo e o medo invadia o coração sem nada entender.
O blog nos permite amigos que aliviam nossa solidão de alma e tristeza do âmago.
Deus merece nossa luta constante em sobrevivermos o melhor possível mesmo sem entender tantas coisas.
A ajuda ao próximo é um álibi impressionante. Como disse Caio Abreu: Botei minha dor no bolso e fui ajudar o próximo.
Tenha dias abençoados!
Beijinhos fraternos
Nanda querida, eu que te acompanho há tantos anos senti e vivi tua dor com a partida do Filipe e depois o outro amor, as mudanças, a criançada toda! Que bom nunca desististe! E assim, mesmo cansada, trabalhando muito, ajudando aos outros vais seguri! Felicidades SEMPRE! beijos, chica
ResponderExcluirOlá
ResponderExcluirCativante sua história. Chegar trigêmeos depois de já ter adotado 4 filhos? Isso é uma aventura...perder seu companheiro assim, por uma apendicite....um daqueles baques que a vida nos dá pra que nós venhamos a ver do que somos feitos. Você não quebrou. Seguiu em frente. Evoluiu. Você é uma grande mulher!
abraços