Tema muito delicado, não queria escrever sobre isto mas...
Enquanto um amigo, defendia seu cargo,
eu não consegui ficar calada.
Dizem que o Brasil tem um rombo na Previdência. Eu digo que o verdadeiro rombo está no pacote de fraldas geriátricas. Quem já precisou comprar sabe: cada ida à farmácia é uma negociação entre a dignidade do idoso e a falência da família.
As prateleiras brilham com embalagens coloridas, tamanhos variados, promessas de conforto, “tecnologia de absorção” e até toque de algodão. No entanto, o preço parece coisa de outro planeta ou de um cofre suíço. Sai-se de lá com duas sacolas pequenas e a sensação de que comprou uma joia rara.
Mas não é luxo, é necessidade. E necessidade diária. Quem cuida de um idoso sabe que não é só a fralda que pesa: é a logística, a rotina, a paciência, o afeto, o olhar para além da fragilidade. A fralda, nesse cenário, é apenas o símbolo mais visível de um cuidado que não pode ser terceirizado.
No fim, o rombo estimado não está só no bolso. Está também na ausência de políticas públicas que pensem no envelhecer com dignidade, no silêncio de quem nunca fala sobre isso, na pressa dos mais jovens que esquecem que, cedo ou tarde, todos caminhamos para o mesmo destino.
E talvez a grande lição seja essa: cada fralda trocada é também um gesto de amor. Um lembrete de que o corpo envelhece, mas a ternura, quando existe, não se gasta nunca.
Falam tanto em rombo da Previdência, como se os aposentados fossem os culpados por esvaziar cofres. O que ninguém conta é o rombo do outro lado: o que a Previdência faz no bolso do idoso. Esse, sim, é estimado em lágrimas e fraldas.
O idoso trabalha a vida inteira, contribui religiosamente e, quando chega a hora de descansar, recebe uma aposentadoria que mal cobre o pacote da farmácia. A Previdência não só fecha as contas no vermelho, como ainda fecha os olhos para quem mais precisa.
Aí o sujeito precisa escolher: fralda ou mistura? Remédio ou conta de luz? Tudo isso depois de ter sustentado o país com impostos e suor. O rombo não está no INSS, está na dignidade arrancada, um boleto de cada vez.
Enquanto isso, nos gabinetes refrigerados, falam em reforma, déficit, porcentagens. Mas ninguém ousa perguntar como é que um idoso sobrevive com o que sobra. Talvez porque não sobre nada.
No fim, o Brasil não tem Previdência: tem pós-vidência. Um sistema que promete cuidar, mas só comparece na hora de cobrar.
O governo, esperto, inventa nome bonito: “benefício”, “reajuste”, “auxílio”. Tudo com cara de presente, como se fosse favor dar de volta ao idoso o que ele já pagou a vida inteira. Um teatro de mágica malfeita, em que o coelho nunca sai da cartola mas a nota fiscal sempre chega.
E tem mais: enquanto o aposentado faz malabarismo para comprar um pacote de fraldas e o comprimido da pressão, surgem manchetes sobre supersalários, auxílios-moradia e reembolsos de vinho importado. É como se o país inteiro dissesse ao idoso: “você que lute, vovô”.
O resultado? A velhice vira prova de resistência. Não é só viver mais é sobreviver com menos. Menos dinheiro, menos respeito, menos cuidado. Quem deveria ser honrado pelo caminho percorrido acaba tratado como peso.
E aí voltamos à palavra que tanto assombra: rombo. Talvez o maior rombo do Brasil não seja nas contas públicas, mas na consciência coletiva. Porque país que não cuida dos velhos cava a própria cova moral.
Eu, particularmente, fico muito decepcionada por eles. Passaram a vida inteira acreditando que haveria um amparo, uma rede de proteção para a velhice, e o que encontram é uma corda bamba esticada sobre um abismo. O idoso olha para o contracheque e percebe que aquilo que deveria ser um descanso virou castigo.
Não é justo. Não é humano. A Previdência, que deveria ser mãe cuidadosa, virou madrasta indiferente. E ainda tem quem fale em números frios, em tabelas que não sabem o que é trocar uma fralda, carregar uma sacola pesada ou dividir o último trocado entre pão e remédio.
Fico decepcionada porque não se trata só de dinheiro trata-se de respeito. Respeito ao tempo vivido, às rugas conquistadas, ao esforço que construiu ruas, escolas, cidades inteiras. Cada idoso carrega nas mãos a história de um país que parece ter esquecido de agradecer.
E se há um rombo, ele está no coração de um sistema que perdeu a capacidade de enxergar pessoas. Porque dinheiro se recupera, mas dignidade, quando se perde, não volta nunca mais.
Falam em déficit, números e reformas. Mas o maior rombo da Previdência não está nas contas: está no bolso e na dignidade dos idosos.
Depois de uma vida inteira de trabalho e contribuição, recebem uma aposentadoria que mal paga fraldas, remédios e contas básicas. O país envelhece, mas não amadurece: promete cuidado e entrega descaso.
O rombo real não é financeiro é moral. Porque um país que não respeita seus velhos, cava a própria falência ética.Deus do Céu!!!
E é isso que mais me dói: ver um país que envelhece, mas não amadurecer. Que se gaba de estatísticas de longevidade, mas não oferece condições dignas para que esses anos a mais sejam vividos com alegria. É como dar de presente um tempo vazio, sem ferramentas para preenchê-lo com qualidade.
Eu penso que cada idoso merece mais do que sobrevida: merece vida. Merece ser lembrado não como número, mas como alguém que já foi criança, trabalhador, sonhador. Merece não apenas uma fralda no corpo, mas o abraço de uma sociedade que entenda que o cuidado é dever coletivo.
Porque um dia seremos nós. E quando esse dia chegar, espero que não encontremos apenas pacotes caros nas farmácias e benefícios minguados no banco. Espero que encontremos respeito, reconhecimento e, sobretudo, amor.
No fim, talvez o maior rombo da Previdência não esteja no dinheiro, mas na falta de gratidão. E essa, meu amigo, é uma dívida que nenhuma reforma será capaz de pagar.
É muito fácil: eles não mexem na aposentadoria do Congresso. Lá, o benefício é gordo, vitalício e blindado contra qualquer déficit. Enquanto isso, o aposentado comum conta moedas para pagar a sua estadia no mundo. Dois pesos, duas medidas.
Todo país tem déficit público. O que muda é a escolha de onde cortar. Aqui, sempre cortam no lado mais frágil: o do idoso que já deu tudo de si. No andar de cima, ninguém sente o baque. O déficit deles é de champanhe francês; o do povo é de feijão no prato quando tem como comprar.
Essa matemática, perversa e seletiva, só confirma o óbvio: a Previdência não é problema de números, é problema de prioridade. E no Brasil, o idoso nunca foi prioridade. É visto como despesa, nunca como patrimônio.
E assim seguimos, com discursos bonitos em tribunas e idosos esquecidos em filas. O Congresso dorme tranquilo com suas aposentadorias intactas, enquanto a população envelhece exausta, gastando o que não tem para manter um mínimo de dignidade.
Crueldade viu?
Fernanda
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depois que a letra nasce
não há silêncio
há um choro que só eu ouço
e um medo que ninguém vê
o medo de mostrar demais
de sangrar diante de estranhos
de ser lida com desdém
ou pior: com pressa
porque parir palavras
é também deixar o peito aberto
num mundo que não sabe lidar
com quem sente fundo
a escrita respira fora de mim
e eu, nua, assisto
alguns dizem que é lindo
outros nem leem até o fim
há quem tente vestir meu poema
com a própria assinatura
como se dor fosse transferível
como se parto tivesse atalho
e é aí que mais dói
quando roubam o nome da minha filha
e fingem que nasceu de outra boca
quando arrancam o umbigo do texto
e dizem: “isso é meu”
não é
eu sei cada madrugada que ela levou
cada perda que empurrou esse verso
cada lágrima que virou frase
não quero aplauso
mas exijo respeito
porque minha escrita
anda no mundo com meu rosto
meus olhos, minha história
e quando alguém a toma como se fosse nada
está me dizendo:
“você também é nada”
mas eu sou tudo
o que ninguém teve coragem de escrever
e continuo parindo
mesmo ferida
porque escrever é a única forma
que conheço de sobreviver
(Fernanda)