Hoje,
enquanto esperava o café coar lentamente, como quem deixa a vida decantar junto com a água quente no pó, me peguei pensando nessa frase que ouvi de um senhor numa palestra antiga: “Não confunda jamais conhecimento com sabedoria. Um o ajuda a ganhar a vida; o outro a construir uma vida.”
Na hora, anotei num guardanapo, como quem guarda um segredo precioso, mas só hoje me dei ao trabalho de decifrar o que aquilo realmente queria me dizer.
O conhecimento, reconheçamos, é vaidoso. Ele gosta de títulos pendurados na parede, diplomas com moldura dourada, medalhas que tilintam no peito e até frases difíceis que impressionam em reuniões. É útil, claro: abre portas, garante salários, paga contas. Conhecimento é meio de transporte rápido, certeiro, quase como um carro último modelo que nos leva de um ponto ao outro da vida.
Já a sabedoria… ah, essa não tem pressa. É aquela senhora de cabelos brancos que fala baixo e olha fundo, que prefere um banco de praça a um púlpito. Sabedoria não se adquire em cursos; ela se acumula em silêncios, em quedas, em amores que doem e em perdas que transformam. Se o conhecimento se exibe, a sabedoria se oferece. É como uma estrada de terra: mais lenta, cheia de curvas, mas que leva a lugares onde a alma respira.
Quantas vezes confundimos um com o outro! Basta lembrar de pessoas que sabem de cor as leis da física, mas não conseguem respeitar o espaço do vizinho. Ou dos que têm doutorados em comunicação, mas não escutam nem o próprio filho. Conhecimento sem sabedoria é como ter uma casa luxuosa sem janelas: falta ar, falta horizonte.
Lembro-me de uma amiga, estudiosa incansável, que fez todas as especializações possíveis em sua área. Um dia, em meio a tanta certidão acadêmica, desabou em lágrimas: “Eu sei tudo sobre meu trabalho, mas não sei nada sobre mim.” Ali estava o retrato vivo da frase no guardanapo. O conhecimento deu a ela a profissão, mas não o rumo. A sabedoria, se cultivada, daria o norte, o sentido, a serenidade para suportar os dias.
É curioso: nas rodas de conversa, o conhecedor fala; o sábio escuta. O primeiro traz respostas prontas; o segundo devolve perguntas que nos fazem pensar. O conhecedor nos impressiona; o sábio nos transforma.
Talvez a maior tragédia do nosso tempo seja acreditar que basta acumular informações para estar preparado para a vida. Nunca tivemos tanto acesso ao conhecimento a internet é uma biblioteca infinita e, paradoxalmente, nunca estivemos tão carentes de sabedoria. Porque sabedoria não se clica, não se copia e cola; ela se vive.
No fundo, penso que o conhecimento é como a semente e a sabedoria é como o fruto. De nada adianta ter o celeiro cheio de sementes se não aprendermos a plantar, regar e esperar o tempo certo da colheita.
Por isso, desconfio que a sabedoria se constrói nas pequenas coisas: no cuidado com quem amamos, na paciência com quem nos irrita, na capacidade de rir de nós mesmos e na coragem de pedir perdão. Ela não rende diploma, mas rende paz. E, convenhamos, paz é um bem que não se compra nem com o mais alto salário.
No final das contas, o café terminou de coar e ficou ali, fumegando, como quem também queria participar da reflexão. Peguei a xícara e, antes do primeiro gole, prometi a mim mesma: que o conhecimento me ajude a ganhar a vida, sim, mas que a sabedoria essa companheira discreta seja a responsável por me ensinar a construir uma vida que valha a pena ser vivida.
Fernanda
Oi, Fernanda, tudo bem? Gosta de coar café, é? Eu uso café solúvel...mais prático...rs em compensação, não consigo poetizar o café sendo coado...mas aí, tudo bem, você poetisa tudo!!!
ResponderExcluirE está certa. Conhecimento e sabedoria são distintos. E como eu já penei em situações onde não tive sabedoria para agir!!
O ideal é ter conhecimento e sabedoria. Mas veja, Einstein chegou a dizer que a imaginação é melhor do que o conhecimento.
abraços.
Oi, Eduardo!
ExcluirTudo bem, sim! Só muito trabalho.E você? Ah, coar café tem mesmo algo de ritual, de poesia silenciosa… cada gota caindo devagar é como um pequeno instante de atenção plena. Mas eu entendo perfeitamente o café solúvel! Prático, rápido… e ainda assim, quem sabe, dá para poetizar o ato de tomá-lo😊até a pressa pode ter poesia escondida, não é? 😉
E você tem razão: conhecimento e sabedoria são distintos, mas a vida nos dá oportunidades de exercitar ambos. Quem nunca se viu perdido sem a sabedoria para agir? Eu mesma me pego refletindo sobre isso o tempo todo.
E Einstein… ah, Einstein! Como a imaginação é generosa: ela nos permite sonhar, criar, reinventar o mundo e, às vezes, até a nós mesmos. Talvez a poesia do café coado seja só mais uma forma de exercitar a imaginação!
Abraços poéticos,🤗
Fernanda
Bom dia, Fernandinha! Pois é, acabou a obra ontem, agora é só casa abagunçada e tudo o mais... Mas vou indo lentamente.
ResponderExcluirLi ontem tuas postagens na cama, já tarde, mas tuas postagens são o meu descanso à noite!E tem uma crônica lá que não havia lido, me passei...mas vou nela!
Essa do conhecimento e Sabedoria está um "Brinco" como dizemos aqui no sul há dezenas de anos. Significa o máximo! Prefiro ter sabedoria, se tivesse de escolher uma, apenas. Nesse mundinho atrapalhado, precisamos da sabedoria. E muita! Esse assunto é ótimo, e com tua vivência, acertaste em cheio, aliás, como sempre, né amiga?
Vou comentando meio atarantada que ando, mas estarei sempre presente.
Um beijinho, querida, adorei o comentário por lá. Consegui postar.
Uma boa quinta-feira!
Ah, o café passado é até romântico, mas... aqui é o solúvel batidinho, também gostoso, fica espumoso.😂😅
Bom noite, minha querida Taís!
ExcluirQue bom saber que minhas postagens são um descanso à noite isso aquece meu coração!
Fico feliz que a crônica sobre Conhecimento e Sabedoria tenha tocado você… ah, se pudéssemos escolher apenas uma, realmente, a sabedoria seria minha aposta também!
Entendo bem a correria da vida e da casa “bagunçada”, mas vá devagar, respirando e limpando cada cantinho em cada momento.
E quanto ao café… solúvel, batidinho, espumoso… quem disse que não tem charme e poesia? 😂
Um beijo enorme, amiga, e uma quinta-feira leve e cheia de pequenas alegrias!
Bom dia de Paz, querida amiga Fernanda!
ResponderExcluirQue post!
"O outro a construir uma vida.”
Estou assim há tempos...
Embora goste demais de aprender, prefiro dar atenção à sabedoria de vida...
Também embora a vida me ponha microfones na mão, púlpitos à leituras, eu prefiro de verdade:
"um banco de praça a um púlpito. "
Como aprendemos e saboreamos o viver!
Sim, pois o que vale a pena não é o muito saber e sim sentir e saborear as coisas intimamente (S. Inácio de Loyola).
Teve uma altura da vida em que dei maior ênfase ao autoconhecimento, comecei nos retiros contemplativos, parti para o Eneagrama e outros caminhos onde tive uma certeza de quem sou e do que realmente eu preciso para viver serena.
A vida pede passagem de forma democrática, sem pisar em ninguém, muito menos mostrar conhecimentos a quem quer que seja.
O sustento garantido já é nossa maior vitória sobre nós.
As perguntas que moveram minha paz:
De onde venho?
Quem sou eu?
Para onde vou?
"No cuidado com quem amamos, na paciência com quem nos irrita, na capacidade de rir de nós mesmos e na coragem de pedir perdão. "
Aqui, você revela os segredo da Sabedoria.
Vou saborear a xícara de café fumegando que nos oferece aqui, Amiga.
Tenha uma tarde abençoada!
Beijinhos fraternos de muita Sabedoria
Bom noite, querida Roselia!
ExcluirQue alegria ler suas palavras tão profundas e cheias de serenidade!
Adoro a sua forma de saborear a vida realmente, a sabedoria vem do sentir e do viver, não apenas do saber. O seu caminho de autoconhecimento e contemplação é um exemplo de paciência e delicadeza com a própria alma. Concordo plenamente: a vida pede passagem com leveza, respeito e coragem.
Fico feliz que minha postagem tenha tocado você e que o café fumegando seja também um instante de pausa e prazer para o espírito.
Desejo que sua noite seja serena e abençoada, amiga querida!
Beijinhos fraternos,
E agora, José, o que faço do meu café que esfriou? Café requentado talvez não depure poesia porque perdeu o tempo do aliciamento que a poesia necessita para o depurar-se. Mas a poesia deglute-se em qualquer estado, ainda que lhe falte água. Qualquer coisa parece servir para constituir-se poesia; é o que você sabe fazer e bem: a poesia escoa de tudo que você escreve. De forma simples, genuína, você discorre com leveza sobre conhecimento e sabedoria desembocando nesses dois afluentes para revelar as variabilidades de um sobre o outro constituindo um poema em que se aglutinam e nos servem filosoficamente sobre o percurso de cada. Mas sempre viajamos atentos aos ventos que se deslocam do conhecimento e demarcam a sabedoria. E seguimos aprendemos a lições de cada dia...
ResponderExcluirMeu abraço bem, apertado, Nanda!
Querido Eros,
Excluirreceber suas palavras é como saborear um café que, mesmo esfriando, deixa aroma e sabor que aquecem o espírito. 🤣
Fico feliz que consiga perceber a poesia que escapa dos detalhes do cotidiano e das pequenas reflexões é exatamente nesse diálogo entre o simples e o profundo que ela se revela. Agradeço por caminhar comigo nessa viagem atenta aos ventos do conhecimento e da sabedoria.
Meu abraço apertado de volta🤗
Bonita prosa com analogias perfeitas Fernanda. Há uma miscelanea com conhecimento e sabedoria. Parece que a sabedoria é prima e irmã do tempo, poque só o com o tempo, é que se percebe o poder da sabedoria. É como se ela fosse aquela senhora que fez faculdade na terceira idade.
ResponderExcluirGostei de ver como dissecou estas duas senhoras, que fazem toda a diferença pela vida.
Um abração amiga.