O jardim parece estar conversando comigo.
As folhas murmuram segredos que não lembro ter vivido. As flores mais perfumadas hoje parecem saber de coisas que meu peito ainda não disse.
Enquanto toca When I Was Your Man,
o vento passa devagar,
como quem entende arrependimentos antigos.
E eu fico assim: entre o cheiro doce das pétalas
e uma dor que não dói,
mas insiste.
O jardim fala.
Eu escuto.
E, sem dizer nada,
ele me devolve a paz que eu tinha perdido
e nem sabia.
Porque às vezes
o amor vai embora,
mas a primavera fica
Esta noite senti vontade de escrever diferente.
Queria fazer um poema
mas saiu isso: uma vontade de ser uma planta,
de brotar em silêncio.
Às vezes a gente brota
sem aviso, como semente esquecida no fundo do tempo.
Brota do nada.
Brota de tudo.
Brota de um perfume que acorda memórias,
de uma música que encosta na pele como quem pede perdão por ter seguido na estrada.
E quando a gente brota,
não é para aparecer
é para existir.
Um pouquinho mais viva,
um pouquinho mais nossa,
como flor que finalmente entende que nascer também é cura.
Hoje, no escuro,
eu desabrochei sem testemunhas.
E o jardim,
cúmplice,
ficou em silêncio só para me ouvir crescer.
Fernanda

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depois que a letra nasce
não há silêncio
há um choro que só eu ouço
e um medo que ninguém vê
o medo de mostrar demais
de sangrar diante de estranhos
de ser lida com desdém
ou pior: com pressa
porque parir palavras
é também deixar o peito aberto
num mundo que não sabe lidar
com quem sente fundo
a escrita respira fora de mim
e eu, nua, assisto
alguns dizem que é lindo
outros nem leem até o fim
há quem tente vestir meu poema
com a própria assinatura
como se dor fosse transferível
como se parto tivesse atalho
e é aí que mais dói
quando roubam o nome da minha filha
e fingem que nasceu de outra boca
quando arrancam o umbigo do texto
e dizem: “isso é meu”
não é
eu sei cada madrugada que ela levou
cada perda que empurrou esse verso
cada lágrima que virou frase
não quero aplauso
mas exijo respeito
porque minha escrita
anda no mundo com meu rosto
meus olhos, minha história
e quando alguém a toma como se fosse nada
está me dizendo:
“você também é nada”
mas eu sou tudo
o que ninguém teve coragem de escrever
e continuo parindo
mesmo ferida
porque escrever é a única forma
que conheço de sobreviver
(Fernanda)