Penso que é na noite que o coração escuta melhor, que o coração
encontra espaço para sussurrar o que, na correria, cala.
Lá fora, gotas de chuva caíam e se intensificavam, cobrindo o
mundo com um véu de água e som. Encostei a testa na vidraça fria, observando a
rua se desfazer em borrões. As pessoas passavam apressadas, protegendo-se sob
guarda-chuvas, como ilhas distantes, como mundos separados.
Pensei nas distâncias não apenas nas geográficas, mas nas
invisíveis, essas que se formam dentro da gente. Às vezes, a distância entre
duas pessoas na mesma sala é maior do que a de dois corpos separados por
continentes. Às vezes, é o silêncio que constrói oceanos, é o orgulho que ergue
muralhas.
As gotas escorriam pelo vidro como pensamentos que eu não
dizia, como gestos que nunca alcancei.
Quantas palavras ficaram presas no peito, transformando-se em
desertos entre mim e aqueles que um dia foram terra firme? Quantos olhares
desviados, quantos abraços não dados, foram cavando vales profundos que hoje,
mesmo com toda a vontade do mundo, parecem difíceis de atravessar?
A chuva lá fora era uma metáfora viva: era preciso atravessar
o desconforto, o frio, a incerteza, para chegar do outro lado. Era preciso
molhar os pés, perder o medo de se molhar por inteira.
Talvez as distâncias que mais doem sejam aquelas que
escolhemos manter sem perceber. Talvez, se tivéssemos a coragem da chuva de
cair, de tocar, de transformar, muitos caminhos ainda poderiam ser refeitos.
E mesmo que alguns abismos pareçam impossíveis de cruzar,
sempre há um passo pequeno que pode ser dado: uma palavra, um gesto, um olhar.
Uma ponte, mesmo que estreita, mesmo que frágil.
Continuei ali, ouvindo o som da água, deixando a saudade
lavar um pouco das pedras que eu mesmo havia empilhado. E, no fundo, uma
esperança tímida germinava: a de que, para algumas distâncias, ainda haja
retorno.
Quando nosso coração em paz e cheio de amor está, na noite, no dia, nas gotas e em tudo, vemos poesia!
ResponderExcluirAdorei!
beijos, chica
Bom dia: - poema deslumbrante que muito gostei de ler. O meu elogio e aplauso
ResponderExcluir.
Saudações cordiais
.
Olá, querida amiga Fernanda!
ResponderExcluirQue bom a esperança que guarda no coração!
"No fundo, uma esperança tímida germinava: a de que, para algumas distâncias, ainda haja retorno."
O cruel é quando não há possibilidade de retorno jamais.
Tenha uma nova semana abençoada!
Beijinhos fraternos
No fundo da noite há um mundo de mistérios,que buscamos explicações. A chuva lá fora lava, leva as diferenças. Aproximam os invisíveis seres sob as marquises, imperceptíveis aos seres apressados e máquinas desorientadas do caos. Os muros lhes parecem intransponíveis, as pontes foram levadas e o próximo passo omitido, faz este alheamento, que impera. Depois da chuva sob um arco-íris brota uma tênue esperança aos olhos ávidos de solidariedade.
ResponderExcluirA noite com chuva nós leva a mergulhos no vazio dos seres.
Muito bom Fernandinha.
Bjs