Hoje uma amiga me pediu o ombro. E nele um conselho.
Achei bonito o gesto o de confiar e curioso também, já que ela é mais vivida, mais experiente na idade. A gente sempre imagina que a vida vai nos ensinando tudo com o tempo. Mas amor não segue calendário.
Ela falou por longos minutos. Relatou crises, silêncios, tentativas. De vez em quando suspirava e olhava pro nada. E eu, ali, entre o ombro e a escuta, pensava nas vezes em que também precisei de alguém pra me lembrar do óbvio: até os 14 anos eu não tinha a quem pedir conselhos.
O problema é que, muitos
Não percebem que amor não é competição. Quando a mágoa entra, não podemos deixar que transforme o sentimento em algo tão sem nexo, pequeno.
Começar a contar pontos: quem fez mais, quem cedeu menos, quem falhou primeiro. Pode parecer jogo, mas é só cansaço. E um cansaço danado de triste.
Falei pra ela, sem receita:
Os anjos também precisam crescer. Não adianta unir duas asas se cada um quer voar pra um lado. Amar é aprender a maturar junto, mesmo quando o “céu” não ajuda.
O que vejo muito, disse, é casal que se encontra, se encanta, se instala… e depois esquece de regar. É isso. Não precisa ser jorro, não precisa inundar. Mas se não molhar a planta na raiz de vez em quando, ela murcha. E às vezes nem é por falta de amor, é por desleixo mesmo.
Ela me ouviu calada, como quem rega a própria dúvida com cuidado. No fim, disse que talvez a relação dela estivesse só sedenta. Ainda viva, mas desidratada.
Tomara que sim.
E que ela volte, não pelo costume, mas por escolha. E que os dois, enfim, se lembrem: no amor, todo dia é dia de plantar um gesto, regar um afeto, colher um pouco de paz.
Porque no fundo, amar é coisa simples mas a gente complica. É que o amor, quando se acomoda, vira mobília da casa: está lá, mas ninguém repara. E aí só se dá conta quando a madeira começa a ranger, quando o silêncio se instala como poeira em móvel antigo.
Disse a ela também, antes de irmos embora:
Não tem casal que resista ao abandono diário. Não o abandono da ausência, mas o da atenção.
Tem beijo que seca se não vier acompanhado de presença. Tem conversa que se perde se não for atravessada por escuta. Tem toque que esfria se não for devolvido por desejo. O amor é bicho exigente: sobrevive a quase tudo, menos ao esquecimento.
Ela sorriu com os olhos um pouco marejados e disse que talvez o problema não fosse falta de amor, mas excesso de orgulho. Eu não discordei. Às vezes o que pesa não é a dor, é o medo de recuar. Como se ceder fosse perder, quando na verdade é o único jeito de continuar.
Nos despedimos com um abraço longo, desses que valem mais do que meia hora de terapia. E enquanto ela virava a esquina, pensei no quanto as pessoas pedem conselhos querendo, no fundo, só coragem pra fazer o que já sabem.
Que bom seria se o amor viesse com manual e cronograma. Mas não: ele exige intuição e zelo. Ele pede prática. Como cuidar de planta, de bicho, de criança. Amar dá trabalho, mas é o único trabalho que compensa.
E ali, naquela manhã fria com cheiro de café no ar, fui tomada por uma certeza serena: amar é mesmo um ato de insistência diária. A rega precisa ser mútua senão vira sede.
Que lindo teu despreendimento de dar ombro amigo para quem dele precisa! Sábios os teus conselhos e tomara ela consiga novamente se encontrar nessa relação!
ResponderExcluirFizeste tua parte!
beijos, lindo fds! chica
Chica querida,
ExcluirTeu carinho aquece o coração muito obrigada! Às vezes, tudo o que podemos (e devemos) fazer é isso: escutar com alma e oferecer o ombro. Torço de verdade para que ela se reencontre, com o outro ou com ela mesma que, no fundo, é sempre o primeiro passo.
Beijo grande, um fim de semana lindo e leve pra ti também!
Nanda
Olá Fernanda!
ResponderExcluirQue lindo esse seu textemunho-crônica.
Você deve ser uma pessoa muito bacana.
É didícil hoje em dia as pessoas se abrirem para as outras. Quando isso acontece, é porque o ombro amigo é de extrema confiança.
Que legal!
Nós estamos em uma época onde tudo que se fala pode ser interpretado contra você, mesmo que a sua intenção seja a melhor.
Uma vez uma pessoa me disse que a comunicação não é o que você fala, mas sim, o que a outra pessoa entende.
Olha só!
Mas as pessoas estão cada vez mais ensimesmadas. Cada vez mais solitárias e cada vez mais afetadas.
Por isso, orgulhe-se por ter a oportunidade de ofertar seu ombro e seus conselhos.
Um abraço minha nova amiga!
Tenha um lindo fim de semana.
Olá, André!
ExcluirFiquei muito tocada com o teu comentário e com a delicadeza do teu olhar.
É verdade: abrir-se hoje em dia virou quase um ato de coragem. Há tanto ruído, tanta pressa e tantas interpretações tortas, que quando alguém confia a dor a outra pessoa… é porque viu ali um porto seguro.
Essa frase que te disseram é poderosa: “a comunicação não é o que você fala, mas o que o outro entende.”
E é bem isso! Às vezes, oferecemos uma palavra com afeto e recebemos de volta silêncio ou mágoa. Por isso, ter a chance de ouvir, acolher e cuidar da dor de alguém virou quase um presente desses que nos lembram que ainda existe afeto no mundo.
Obrigada pelo carinho. Que bom saber que há gente como você por aí sensível, lúcida e generosa.
Seguimos tentando… com o coração aberto.
Um abraço grande da tua nova amiga também.
Que teu fim de semana seja lindo e leve
😘
É sempre certeiro usar a metáfora de jardim com a relação a dois: regar. Como você mesmo escreveu, não existe manuel. Surge então a necessidade de "intuição e zelo". Ótimo escrito.
ResponderExcluirDell, que bom te ler aqui.
ExcluirSim… o jardim como metáfora para o amor sempre me pareceu certeiro exige presença, cuidado, pausa, escuta. E como bem apontaste, não existe manual mesmo. Às vezes, o que floresce não é o que a gente plantou, e outras vezes o que parecia seco renasce só porque alguém teve o zelo de regar.
Obrigada por perceber essas entrelinhas.
Um abraço cheio de afeto e que tua semana seja leve como um vento de primavera.
😘
Querida Fernanda,
ResponderExcluirO amor é uma planta frágil. Nasce tímido, num canto de terra que não sabemos se é fértil. Precisa de sol, mas teme o calor em excesso. Quer água, mas afoga-se fácil. É sensível ao vento das palavras duras, aos silêncios longos como noites de inverno.
Cresce devagar, folha a folha, gesto a gesto. Não floresce ao grito mas ao cuidado, ao toque leve, ao olhar atento.
Quem ama, aprende a jardinar o coração.
Aprende a podar o ciúme, a regar com ternura, a proteger das pragas da rotina...
e mesmo assim, ás vezes fenece.
O amor precisa ser cultivado com a alma entre os dedos!
Um abraço com carinho.
Que comentário mais lindo, Albino! Fiquei encantada com a delicadeza da tua escrita poesia em estado puro. Você traduziu com sensibilidade tudo aquilo que tantas vezes sentimos, mas nem sempre sabemos nomear. Esse amor-planta que brota incerto, que pede sol e sombra na medida, que teme o exagero e floresce no silêncio bom de quem cuida com alma…
ExcluirSim, jardinar o coração é uma arte. E tua metáfora me faz lembrar que até quando o amor fenece, ele deixa raízes às vezes invisíveis, mas presentes.
Obrigada por esse abraço em forma de palavras. Recebo com gratidão e retribuo com afeto.
Que a tua semana seja fértil de ternuras.
😘
A vida é experimentar! Com muita ou com pouca idade, há quem tenha experimentado pouco, ou nunca tenha experimentado o amor. Acho um privilégio poder ajudar alguém que é mais experiente que nós, quando geralmente é o contrário.
ResponderExcluirO amor como ingrediente vital em toda relação, que mesmo que seja fazendo parte de um aprendizado diário, nunca pode faltar.
Você mostrou grande maturidade ao mostrar a ela “o óbvio”. Aquele óbvio que não é tão óbvio para muitos, mas que mesmo assim não deixa de ser muitas vezes decisivo em nossas vidas.
Meu coração se enche de alegria em te ver assim, como uma criança ainda, mas que cresceu tanto!
Amo muito você minha quelidissima companheira de café com pão de queijo!
Pai,
ResponderExcluirTe ler é como receber um abraço daqueles que aquecem até os ossos desses que só o teu olhar e teu coração sabem dar.
Sim… a vida é experimentar. E quando o amor entra como ingrediente, até o que dá errado alimenta. Às vezes, a gente só precisa mesmo de alguém que nos lembre o “óbvio” com carinho e paciência como você tantas vezes fez comigo, sem nunca me apontar o dedo, mas sempre oferecendo a mão.
Fico feliz que você veja em mim esse crescer… mesmo que, por dentro, eu ainda corra atrás de borboletas e me emocione com cheiro de café e pão de queijo na cozinha. Te amo imensamente, meu quelidíssimo companheiro de afeto e de fé! Obrigada por sempre me ver com olhos de pai, mas também com alma de amigo.
Te amo demais 🙏🏻♥️😘
Pois é, a coisa mais difícil é dar conselhos para casais, pois vejo que cada casal é diferente do outro e "conselhos-recita" não funcionam para todos.
ResponderExcluirPorém, talvez haja uma coisa que a todos seja importante: Esse regar diário do amor.
É isso, Eduardo. Cada amor tem seu idioma, mas talvez o cuidado seja mesmo a única linguagem universal. Regar o afeto diariamente com escuta, presença, humor ou silêncio pode não garantir tudo, mas sem isso, quase nada floresce.
ExcluirObrigada