Tudo bem, com quase 15.
Quase ainda menina. Quase ainda filha, porque faltava ainda dois meses, para ter morado com meus pais adotivos até os 15. Mas a vida não esperou eu estar pronta. E, de algum jeito, eu quis também. Quis amar, construir, cuidar. Quis tanto que nem percebi que já estava vivendo tudo ao mesmo tempo: ser filha, casamento, maternidade, decisões de gente grande com um coração ainda aprendendo a bater sem medo.
Quase não fui filha direito, porque encontrei filhos que precisavam de mãe e eu quis o papel.
Ninguém me pediu. Ninguém me obrigou.
Mas havia ali olhares esperando acolhimento, e eu fui. Fui com tudo que eu tinha. E o que eu tinha era amor e coragem, mesmo que eu ainda não soubesse dar nome pra isso.
O principal de tudo e disso e eu nunca duvidei é que Felipe, apostava no mesmo querer que o meu. Ele, com 22 e faltando um ano para concluir a facul acreditou em nós.
Eu amei Felipe com toda a força do meu coração a primeira vista.
Amei mesmo.
E ele, a mim.
A gente se amou bonito. A gente se amou do jeito que dava, com a juventude nos atropelando e, ao mesmo tempo, nos salvando. Era pra ter sido exatamente como foi.
Fomos tão felizes até onde nos foi possível ser. E isso basta. A gente foi lar um pro outro. Isso nunca se apaga. Depois que ele virou estrela, fui ser ainda mais guerreira. Porque a vida seguiu. Porque os filhos cresciam. Porque a gente já tinha uma grande e bonita família pra sustentar no afeto, no cuidado, na presença.
Quando adotamos Pedro, eu estava grávida de trigêmeos. Isso mesmo: três corações crescendo ao mesmo tempo dentro de mim, enquanto outro coraçãozinho chegava pelos braços da vida, sem barriga, mas com destino. E eu abracei.
Clarinha chegou com cinco anos. Chegou com seus silêncios e as perguntas que não sabia fazer. Chegou e ficou. Virou minha filha como se sempre tivesse sido. E eu aprendi, com cada um deles, que o amor não se divide ele se multiplica.
Que dá, sim, pra ser casa pra muita gente. E que ninguém precisa ter vindo do mesmo lugar pra pertencer ao mesmo abraço.
Hoje, olho pra trás e vejo uma história que não seguiu roteiro. Mas foi linda do nosso jeito.
E continua sendo.
Começou cedo demais, exigiu mais do que eu sabia dar, me fez mulher antes da hora… mas me deu também o que ninguém pode tirar: a certeza de que eu fui amor onde podia ter sido ausência. E fui coragem onde só havia medo.
Fui mãe, fui parceira, fui abrigo e ainda sou.
Depois disso, a vida seguiu diferente.
Os filhos estao crescendo Um por um, com suas manias,
seus jeitos, seus sonhos que às vezes batem contra os meus.
Aprendi a deixá-los ser. Aprendi a não ser necessária o tempo todo e ensinar de um modo mais independente com vigilância. Isso, confesso, faz que eu sinta um friozinho na barriga e orgulho deles.
Felipe já não estava. Partiu quando a gente ainda tinha tanto pra viver. E eu fiquei.
Fiquei com os braços cheios de tarefas, a cabeça cheia de porquês e o peito cheio de silêncio. Dizer que fui forte seria clichê. Eu sobrevivi. E isso, por si só, já foi heroico.
Fui me reconstruindo em detalhes: um café tomado sozinha, uma música que eu ouvia só por mim, uma gargalhada solta sem precisar dividir com ninguém. Fui me reencontrando com essa mulher que existia antes de todos mas que eu tinha esquecido de olhar.
Não parei os estudos.
Foi muito difícil conciliar, mas com ajuda do alto, de meus sogros e pais conciliei.
Eles me mandavam viver.
E de tanto que eles aconselhavam eu fui.
Fui, sem vontade, sem querer ir.
Redescobri meus desejos de ainda menina-grande. eu ainda crescia em tamanho.
Risos... Me permiti um batom dado por minha sogra-mãe, uma ida ao cinema só minha.
Uma noite sem ser de ninguém.
e eu não sabia mais ser só.
Mas confesso, era tudo tão automático.
A vida para o sentido amoroso perdeu o tom.
Muitos convites, na escola, no trabalho, mas eu não estava pronta.
Depois de um tempo longo…
Ele apareceu.
André.
Chegou sem prometer nada.
Era amigo de meu sogro-pai, na clinica e atendia lá.
Com um jeito leve, meio desajeitado de quem não sabia exatamente onde pisava e talvez por isso mesmo, me alcançou onde ninguém mais alcançava.
Não era sobre substituir. Nunca foi.
Era sobre permitir.
Permitir ser amada de novo.
Permitir rir alto, fazer planos pequenos, contar histórias sem dor no fundo.
Permitir que alguém me visse como mulher,
era algo que eu não aceitava.
Mas ele insistiu.
E não só como mãe, não só como guerreira,
não só como quem ficou.
Ele me via com admiração, amiga e mulher.
A verdade é que a gente sempre acha que já viveu o amor inteiro. Mas a vida tem dessas surpresas: ela inventa espaço onde parecia não caber mais ninguém.
Hoje, sou tantas em uma só.
Sou mãe, sou viúva, sou mulher que recomeçou.
Sou a que se apaixonou de novo, com medo mesmo, mas com vontade.
Sou a que escreve porque escrever é a única forma de caber inteira no mundo.
E quando olho pra tudo que vivi, não vejo uma história quebrada. Vejo um rio: com curvas, corredeiras, pausas e profundezas. Um rio que segue, mesmo quando parece ter parado.
E eu sigo.
Porque há sempre mais de mim pra descobrir.
Fernanda
Uma linda história que começou cedinho, pois tudo estava escrito pra vocês e a criançada chegando, os trigêmeos e cada um sendo realmente esperado e desejado!
ResponderExcluirAdorei e gosto muito da história de vocês.Lembro que te acompanho desde que apenas namorava o Felipe! Faz tempo! Desejo SEMPRE mais e mais amor pra ti, pro Anfdré e cada um dos filhos! beijos, chica
Chica querida, que memória linda a sua e que ternura em acompanhar essa história desde tão cedo, lá do tempo em que tudo ainda era promessa! Por isso meu carinho por você e a Toninho é tão grandioso.
ResponderExcluirSim, os trigêmeos chegaram como presente multiplicado, cada um trazendo seu próprio milagre.
Teu carinho atravessa os anos e chega sempre feito abraço quentinho. Obrigada por esse afeto constante e por torcer com o coração.
Receba meu beijo com gratidão e carinho,
Obrigada 🙏🏻
Nanda🥰
Nanda, estou aqui há quinze minutos sem as palavras desejadas para dizer qualquer coisa. Mas não preciso dizer-lhe nada. Sua história é para ser lida, conhecida e guardada. Nada corrompe essa história de vida, nada corrompe essa entrega, nada corrompe tanta emoção vivida e outras tantas que serão vividas...
ResponderExcluirAbraços, Nanda!
Eros, teu silêncio cheio de presença me tocou profundamente. Às vezes, as palavras mais bonitas são justamente aquelas que não chegam porque estão sentindo demais para caber em frases. Obrigada por guardar essa história com tanto respeito e afeto.
ExcluirNada corrompe o que é vivido com verdade.
Recebo teu abraço com emoção e te devolvo outro, sincero e inteiro.
Com carinho,
Nanda😘
Boa noite de Paz, querida amiga Fernanda!
ResponderExcluirJá li o post algumas vezes, quis assentar a mensagem de vida em meu coração primeiro.
15, 19... são datas que vão além dos números em si.
O que contou para nós foi que assumimos nossos meninos com todo Amor da nossa tenra idade. Valentia do amor dentro de nós.
Cada vida tem seus mistérios inexplicáveis e a sua não foi diferente, nem a minha.
Sei, perfeitamente, que a necessidade que temos de escrever e reescrever nossas histórias não é melodrama, é que ficou Tatuada na alma tudo que vivemos e muita coisa ninguém sabe ou saberá.
Sabe, querida, quando fiz minha pós, aprendi que as dores que sofremos formam pérolas em nós. Não é fácil ter o coração repleto de pérolas, até porque elas não são fáceis de serem encontradas como você bem sabe. Foi preciso muita luta para escondemos (formarmos) as pérolas em nosso íntimo.
Eu não leio suas dores com leveza, sempre fico com o coração muito embargado.
Quiçá não seria uma relação de espelho?
Deus saberá e é o que importa.
Admiro quem tem coragem de ser autêntica num mundo tão superficial. Sabemos que os outros nos taxam, mas temos nossos motivos para desopilarmos nossas histórias.
Talvez muitos não mereçam nem conhecer, mas o mérito alheio não é da nossa responsabilidade. Não devemos nos arvorar em juízes dos semelhantes.
Mais uma vez, peço desculpas por me estender nos comentários, são poucas as pessoas que falam a verdade de si e eu adoro quem o faça. Tenho muita identificação com seus relatos.
Quanto à chance que deu ao amor novo, creio, piamente, que serei eternamente viúva....
Tenho meus motivos. As dores da alma não se curam em poucos anos. Não quando a ferida foi profunda demais, leva um tempo imenso e eu não tenho mais tempo hábil de esperar décadas como já fiz.
Banhada em lágrimas, desejo uma noite abençoada com meu pedido a Deus de que tenha felicidade plena com seu esposo e filhos bem como toda sua grande família.
Senti agora uma imensa saudade da minha avó Celina, queria tê-la agora aqui comigo recolhendo minhas lágrimas. Só quem sofre sabe consolar outro corações.
Tenha um final de semana abençoado e feliz!
Beijinhos fraternos
P.S. Se achar por bem não publicar, não me aborrecerei viu? Fique tranquila!
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Roselia querida,
ExcluirLi tua mensagem com o coração aberto, em silêncio longo, como quem segura uma carta antiga com as duas mãos. É impossível não me emocionar com tua coragem de sentir fundo e partilhar o que tantos escondem como se as dores pudessem, de fato, ser silenciadas. Não podem. Elas reverberam, e sim, viram pérolas… dessas raras, forjadas na solidão e na travessia.
Tua leitura foi espelho, sim. Um desses espelhos que não distorcem, apenas revelam. Quando você diz que não é melodrama, mas história tatuada na alma, eu reconheço essa marca porque carrego a mesma.
E sim, talvez nem todos compreendam ou mereçam conhecer, mas a escrita, como a lágrima, não pede licença: ela vem para limpar o que sufoca. Sobre tua avó Celina… senti teu amor por ela pulsar como reza antiga. Que ela te acolha, de onde estiver, com o mesmo colo que te falta agora. E quanto a essa dor que ainda dói : não há tempo certo para se curar do que partiu com pedaço da gente. Há apenas a coragem de seguir, um dia após o outro, mesmo com a alma costurada. Recebo tuas palavras como quem recebe um abraço longo e verdadeiro.
Obrigada por dividir tua história comigo ela agora também mora um pouquinho em mim.
Com todo meu carinho,
Fernanda🥰
OI, Fernanda, tudo bem por aí?
ResponderExcluirDepois de ler essa parte da sua biografia, não tem como não estar tudo bem, ainda que nunca tudo está bem a todo momento. A vida nos prega peças, nos manda coisas inesperadas para o bem e para o mal, a nós cabe, como você bem disse, sermos rio que não seca, que segue seu curso sempre se renovando.
Você é uma vencedora em todos os sentidos.
Oi, Eduardo! Que alegria receber suas palavras tão generosas. A vida, de fato, é cheia de curvas, barrancos e corredeiras mas a gente aprende a remar, né? Ou, como você bem disse, seguimos sendo rio: ora manso, ora bravo, mas sempre em movimento.
ExcluirObrigada pelo carinho e por ler com o coração. Seguimos.
Abraço grande,
Fernanda