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Eu amo escrever. Escrevo porque às vezes não cabe tudo aqui dentro. Porque há sentimentos que só se organizam quando viram palavras, e pensamentos que só fazem sentido quando dançam na página. Amo também olhar o céu e talvez isso diga tudo. Há quem olhe o céu para prever o tempo, eu olho para prever a mim mesma. Há algo em observar as nuvens, as estrelas ou o silêncio azul que me faz lembrar que existe poesia mesmo nos dias comuns. Este blog nasce desse encontro: entre a escrita e o céu. Vai ser um espaço para dividir pensamentos, contar histórias, guardar pedaços de mim e talvez, de você também, que me lê agora. Obrigada por estar aqui. Que você se sinta à vontade. Que cada texto seja como uma janela aberta, onde o vento entra leve e, quem sabe, traz um pouco de luz também

Amor sempre....

Amor sempre....
Caminho entre flores. O chão continuará pra nós com outras paisagens. Sou o que sou, porque é tudo que sei ser. E todo meu olhar escrito que você nunca aprendeu a ler, permanecerá no descaso para quem não compreende.

03 julho, 2025

Salto alto e altura

Aleatoriamente um toque de poesia


Tenho um metro e oitenta. Isso já é o suficiente para escutar “nossa, que alta!” umas quatro vezes por semana, três delas vindas de completos desconhecidos que acreditam estar revelando uma informação inédita. Como se eu, com minha testa perigosamente próxima dos batentes de porta e minha eterna dificuldade em encontrar calça comprida que chegue até o tornozelo, não soubesse disso.

Mas aí… eu resolvo colocar salto alto.

Sim, salto alto. Aquela peça de ousadia, desequilíbrio e um tantinho de provocação. Não por necessidade porque, vamos combinar, se tem uma coisa que eu não preciso é de mais centímetros mas por gosto. Por afronta poética ao senso comum. E porque sou uma mulher!

Basta eu sair com meus onze centímetros a mais que o mundo entra em colapso. As pessoas me olham como se eu estivesse desafiando a gravidade e a lógica social ao mesmo tempo.
“Mas você já é tão alta!” dizem.
E daí? penso, enquanto sorrio com a delicadeza de quem já ouviu isso umas quinhentas vezes e aprendeu a dançar no desconforto alheio.

Porque, veja bem: usar salto alto quando você já é alta não é só sobre moda. É um ato de resistência estética. É sobre não se curvar para caber. É dizer: eu sei que estou um palmo acima do padrão, e não vou me abaixar para parecer aceitável. É ocupar espaço sem pedir desculpas e, de quebra, fazer barulho elegante no chão de madeira.

O salto me dá “poder”, mas não porque me deixa mais alta. Ele me deixa mais minha. Porque eu o escolho mesmo quando o mundo acha “demais”. Porque eu canso de me adaptar e resolvo, por um instante, me elevar literalmente e simbolicamente. E tenho motivos e você vai entender.

E se alguém se sentir desconfortável com a minha altura aumentada, sugiro apenas uma coisa: que se eleve também. Nem que seja na alma.

A altura, aliás, sempre foi um assunto desde a infância. Quando criança, eu já era “a grandona”. Aquela que aparecia na foto da turma como se tivesse sido transferida de sala por engano.

E enquanto minhas colegas ainda brincavam de boneca, eu já precisava escutar piadinhas de adulto:
“Nossa, mas você tem quantos anos mesmo?”
“Vai jogar basquete?”
“Vai ser modelo?”
Mal sabiam que eu só queria caber no balanço da pracinha sem ser retirada de lá por algum funcionário da prefeitura com a sensibilidade de um poste.

Sim, acontecia. Várias vezes. Eu me sentava no balanço com o cuidado e a alegria infantil de qualquer criança e lá vinha o aviso:
“Você não pode ficar aí, esse brinquedo é para crianças menores.”
Mas eu era uma criança. Só que em tamanho ampliado.
Me lembro de rir por fora acanhada, e me encolher por dentro.

Era como se o mundo dissesse: “você é grande demais para isso” para o brinquedo, para o choro, para a fragilidade. Desde cedo, fui convidada a crescer por fora e por dentro ao mesmo tempo. Mas o lado de dentro pedia colo, pedia espaço, pedia um balanço que me coubesse sem julgamento.

Hoje, adulta, entendo que o salto alto que uso diariamente físico, simbólico, emocional começou ali. Quando tive que me retirar de um brinquedo por ser “grande demais”. Quando precisei caber nas expectativas, e não nos balanços.

Mas olha só: sobrevivi.
E mais do que isso aprendi a fazer do meu tamanho não um incômodo, mas um ponto de vista. De cima, sim. Mas com empatia. Com humor. Com força.

E ainda me pergunto: por que é que o mundo insiste tanto para que a gente se encaixe, se ele mesmo é tão mal projetado para corpos reais?

A verdade é que aprendi a viver assim rindo dos sustos alheios, das portas baixas, das cadeiras pequenas, e dos homens que encolhem quando eu chego.
Subo no salto, e sigo.

Porque se é pra ser grande, que seja com intenção.
Risos…





Fernanda

10 comentários:

  1. Divertidas colocações e experiências essas ,Nanda!
    Que continues a subir no salto ,olhar tudo do alto e deixar os babacas que querem explicações pra tudo ,de boca aberta!rs.

    Aliás, usa bastante, enquanto der! Eu há muitos anos, só nos baixinhos e especiais para pés "podrinhos!rs...

    beijos, tudo de bom,chica

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    1. Chicaaa! 😂
      Ai, que delícia ler você!
      Pode deixar que sigo firme no salto (mesmo que por dentro eu esteja de chinelo e rezando por um banquinho pra sentar).
      Mas ó: vou aproveitar enquanto os pés ainda colaboram porque se tem uma coisa que aprendi com as sábias como você, é que chega uma hora que o estilo cede lugar à sobrevivência dos dedos! rsrs
      E sim, vou continuar subindo no salto e descendo o olhar nos exigentes que sigam tentando entender o inexplicável, enquanto a gente vive o que sente!

      Beijo grande e obrigada por estar sempre por perto, com tua leveza e tua risada deliciosa!

      Nanda!

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  2. Fernanda!...
    Dizem que os sonhos andam lá no alto...
    Talvez a tua altura te aproxime dos sonhos
    A vida é sempre melhor depois de uma escalada desafiadora...
    Contudo... numa floresta de gigantes, um pequeno arbusto pode tocar as estrelas!

    Um beijo.

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  3. Albino querido,

    que comentário mais bonito!
    Você transformou altura em metáfora e me deixou sorrindo feito quem, de repente, se viu mais perto dos sonhos… Sim, talvez eu viva mesmo nos desafios rsrs mas é nestas raízes
    (às vezes bem miúdas, quase invisíveis) que me reconheço. E, olha… adorei esse arbusto ousado, que mesmo pequeno, toca as estrelas com a coragem de quem não sabe do próprio tamanho. Obrigada por me lembrar que cada passo alto ou baixo pode ser poesia.

    Um beijo grande, com carinho e gratidão.

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  4. Boa tarde de chuvinha fina e friozinho leve, querida amiga Fernanda!
    Pensar que eu ia aos bailes da Academia Militar com salto 18... santo Deus!
    Hoje, nem pensar, e os ortopédicos são os preferidos para aliviar dores até da alma, rs...
    Seu post tem pontos muito relevantes para mim:

    "É ocupar espaço sem pedir desculpas".

    Demorei a ocupar meu espaço, agora ninguém o ocupa mais. É todo meu e de quem me ama de verdade.
    Lembro-me de uma grande tristeza que tive na pré adolescência com uns dez anos, pedi ao Papai Noel uma boneca e tive a primeira grande decepção: "-você é grande demais para acreditar".
    Para que me fizeram crer?

    "Você é grande demais".
    Agora, Deus me fez perceber que sim, sou grande demais para Ele e o resto é acréscimo.

    "Porque se é pra ser grande, que seja com intenção."

    Assim procuro agir, inteira, grande e agradável a Ele.
    Um dos meus defeitos é crer de verdade, não sou desconfiada que nem a fama dos mineiros, creio ainda muito, preciso acreditar muito menos em pessoas, sobretudo, já que, em Deus, recebo a Graça de confiar plenamente.
    Seu post me ensina ainda mais a ser Grande, sem soberba alguma, claro!
    Altaneira, majestosa em princípios, no Amor...
    Muito obrigada por nos dar incentivos e mostrar verdades.
    Tenha um anoitecer abençoado!
    Beijinhos fraternos de paz

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    1. Roselia, querida,

      Te ler é como escutar uma música antiga que sabe dizer tudo com dor, com fé e com beleza.
      Esse “sou grande demais para Ele e o resto é acréscimo” ficou ressoando aqui. Que maneira linda de ocupar o espaço com humildade e presença.
      Obrigada por partilhar suas memórias, suas dores e sua fé desse jeito tão inteiro. Me sinto honrada de caminhar um pouquinho ao seu lado, mesmo que em palavras.

      Beijinho terno,
      Fernanda

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  5. Eita!
    Eu sou baixinho.
    1,72. Não sou baixinho, baixinho, mas sou.
    Quando eu estava na quarta série tinha uma menina que era enorme. A gente chamava ela de girafona.
    Acredita que outro dia eu conversanndo com ela, fiquei sabendo que ela parou com 1,70!!!!
    O problema é que ela com 12 anos já tinha essa altura, enquanto todo o resto da turma parecia anão perto dela.
    Eu não ligo para a altura das pessoas.
    Tem pessoas lindas mesmo sendo feias.
    Lindas por dentro. Lindas para conversar, dar risada, entender as coisas corretamente.
    E tem pessoas horríveis, mesmos endo lindas.
    Aprendi isso com as cabeçadas da vida.
    Belo texto minha amiga grandona!
    Aqui embaixo está frio hoje, e aí em cima?

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    1. André,
      kkkkkkops, 🤭),
      Amei tua história da “girafona”! Rachei de rir aqui e juro que fiquei imaginando a turma de anõezinhos ao redor dela. Olha o bullying da infância aí, hein? Ainda bem que crescemos… pelo menos por dentro (ou tentamos, né?).
      E você tem razão: tem gente que é gigante de alma mesmo sendo compacta de corpo você é um caso raro, desses que a gente quer guardar no bolso e levar junto pra vida. 😜
      Aqui em cima tá brisa forte e um friozinho gostoso, elegância e um pouquinho de ironia fina. Aí embaixo, segura o frio e se agasalha com afeto, tá?

      Beijo do alto da minha torre, haha 😛
      Nanda!

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  6. Gosto dessa afronta poética vinda lá do alto, e da sua resistência estética. O resto, deixa voar como um guardanapo, Nanda!
    Abraços, .

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    1. Eros,
      gostei da imagem do guardanapo ao vento. E sim, sigo te lendo com essa alegria rara de quem encontra abrigo até nas afrontas. Do alto ou do avesso, tua resistência também é poesia.

      Abraços
      Nanda

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depois que a letra nasce
não há silêncio
há um choro que só eu ouço
e um medo que ninguém vê
o medo de mostrar demais
de sangrar diante de estranhos
de ser lida com desdém
ou pior: com pressa
porque parir palavras
é também deixar o peito aberto
num mundo que não sabe lidar
com quem sente fundo
a escrita respira fora de mim
e eu, nua, assisto
alguns dizem que é lindo
outros nem leem até o fim
há quem tente vestir meu poema
com a própria assinatura
como se dor fosse transferível
como se parto tivesse atalho
e é aí que mais dói
quando roubam o nome da minha filha
e fingem que nasceu de outra boca
quando arrancam o umbigo do texto
e dizem: “isso é meu”
não é
eu sei cada madrugada que ela levou
cada perda que empurrou esse verso
cada lágrima que virou frase
não quero aplauso
mas exijo respeito
porque minha escrita
anda no mundo com meu rosto
meus olhos, minha história
e quando alguém a toma como se fosse nada
está me dizendo:
“você também é nada”
mas eu sou tudo
o que ninguém teve coragem de escrever
e continuo parindo
mesmo ferida
porque escrever é a única forma
que conheço de sobreviver
(Fernanda)