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Eu amo escrever. Escrevo porque às vezes não cabe tudo aqui dentro. Porque há sentimentos que só se organizam quando viram palavras, e pensamentos que só fazem sentido quando dançam na página. Amo também olhar o céu e talvez isso diga tudo. Há quem olhe o céu para prever o tempo, eu olho para prever a mim mesma. Há algo em observar as nuvens, as estrelas ou o silêncio azul que me faz lembrar que existe poesia mesmo nos dias comuns. Este blog nasce desse encontro: entre a escrita e o céu. Vai ser um espaço para dividir pensamentos, contar histórias, guardar pedaços de mim e talvez, de você também, que me lê agora. Obrigada por estar aqui. Que você se sinta à vontade. Que cada texto seja como uma janela aberta, onde o vento entra leve e, quem sabe, traz um pouco de luz também

✿Amor sempre....

✿Amor sempre....
Caminho entre flores. O chão continuará pra nós com outras paisagens. Sou o que sou, porque é tudo que sei ser. E todo meu olhar escrito que você nunca aprendeu a ler, permanecerá no descaso para quem não compreende.

21 agosto, 2025

O Fio da Meada

Aleatoriamente um toque de poesia
Crônica



O planeta anda doente, e não falo apenas da natureza que clama por socorro. Adoece também o coração humano. Na clínica, vejo rostos aflitos, olhares perdidos, passos apressados de quem tenta escapar de dentro de si. Até as crianças  tão pequenas e frágeis carregam sintomas de um estresse precoce, como se já lhes tivessem roubado a leveza da infância.

Deus do céu! Falta amor. Falta colo. Falta escuta. O que sobra são gritos e gritos não são diálogo. O ser humano precisa aprender a falar com mansidão e, mais ainda, a ouvir com paciência. Precisa ousar dar o primeiro passo em direção ao perdão, porque esperar que o outro se mova primeiro é prolongar o abismo.

Dizem que a pandemia nos ensinaria algo. Mas parece que muitos se esqueceram antes mesmo de cicatrizar as feridas. Continuamos correndo atrás de banalidades, como se o essencial pudesse ser adiado. O planeta grita, as famílias gritam, as crianças gritam. E quase ninguém escuta.

É preciso achar o fio da própria meada. Cada um precisa mergulhar dentro de si e perguntar: o que tenho feito do amor que me foi dado? Porque sem o Criador fonte de tudo o que somos e temos não passamos de poeira soprada pelo vento.

E talvez o verdadeiro remédio para este mundo cansado seja exatamente este: reencontrar Deus dentro de nós, não nas palavras prontas, mas no gesto cotidiano de amar, perdoar e recomeçar.

Outro dia, entrou na clínica uma mãe ofegante, arrastando o filho de sete anos pela mão. A criança, com os olhos marejados, não parecia doente do corpo era a alma que pesava. Enquanto a mãe falava sem parar, despejando suas angústias em tom de reclamação, percebi que o menino apenas queria colo, apenas queria silêncio para poder existir. Quantas vezes, na ânsia de cuidar, não esquecemos de olhar?

Também recebi um senhor que chegou com palpitações no peito. Temia um enfarte. Os exames, no entanto, diziam outra coisa: o coração físico estava forte, mas o coração das emoções se encontrava exausto de tanto rancor acumulado. A cada palavra, ele falava mais dos erros alheios do que das próprias dores. Como explicar que o perdão é, muitas vezes, o maior remédio?

E não é só dentro da clínica. Caminhando pela rua, ou no supermercado, vejo a pressa estampada nos rostos, a falta de paciência em filas, a incapacidade de sorrir para o desconhecido. É como se estivéssemos todos hipnotizados pela rotina e tivéssemos esquecido de que a vida é um sopro que pode se desfazer num segundo.

Olhar o mundo hoje é, de fato, sentir-se um pouco louco. Como pode tanta banalidade ocupar tanto espaço? Conversas sobre compras, disputas por coisas passageiras, ofensas lançadas com a leveza de quem joga papel no vento. Mas quando se fala de alma, de amor, de Deus… aí sim o silêncio toma conta, e quase ninguém se aproxima.

O fio da meada não está perdido. Ele continua em nossas mãos. Só que alguns o deixaram enrolar demais, nós sobre nós, esquecendo que desenrolar exige calma, paciência e coragem de recomeçar. Talvez seja isso que o Criador nos pede: menos gritos, mais escuta; menos correria, mais presença; menos medo, mais fé.

E se o planeta está doente, é porque nós, seus filhos, também estamos. O mundo não precisa apenas de tecnologia, mas de afeto. Não precisa apenas de progresso, mas de humanidade. Quem sabe, se cada um reencontrar dentro de si o fio da própria meada, possamos costurar um tecido novo  mais leve, mais justo, mais divino.

Hoje foi outra criança. Trazia os olhinhos marejados e um silêncio profundo, desses que gritam mais do que qualquer palavra. A mãe, aflita, queria respostas rápidas: exames, remédios, soluções. Mas a pequena não tinha dor de cabeça, não tinha dor de estômago, não tinha febre. O que havia nela era uma dor invisível  a dor de viver em uma casa onde ninguém escuta.

Enquanto a mãe falava, percebi que a menina se encolhia ainda mais. Pedi que me contasse sobre suas brincadeiras. Ela demorou a responder, como quem busca na memória algo esquecido. Por fim, disse baixinho: Não tenho tempo de brincar. Mamãe e papai brigam muito.

Deus do céu, pensei de novo. Quantas crianças carregam pesos que não são seus? Quantos pequenos estão sendo moldados pelo barulho das discussões, pela frieza dos gestos, pela ausência de abraços? O estresse que chega cedo demais rouba a infância e marca para sempre o adulto que virá.

É curioso e triste perceber que muitos adultos buscam remédio para curar sintomas, quando o verdadeiro tratamento começa no afeto. Um abraço, um pedido de desculpas, uma conversa sem pressa, uma refeição compartilhada em paz: eis terapias que não se vendem em farmácia.

Hoje, ao ver aquela menina, senti ainda mais forte que o planeta não está doente sozinho. Ele apenas reflete os adoecimentos que nascem dentro de cada lar, dentro de cada coração. E, ao mesmo tempo, me veio uma certeza doce: se a doença começa em nós, a cura também começa.

Talvez a lição esteja nisso: perceber que cuidar de uma criança, ouvir seu silêncio e respeitar suas lágrimas é, de alguma forma, cuidar do mundo inteiro.

Eu a sentei no colo e contei uma história. Daquelas simples, inventadas na hora, em que uma borboleta perdida encontra um jardim cheio de flores coloridas. Enquanto falava, vi os olhos dela se acenderem, vi sua respiração ficar mais leve. A cada detalhe que eu criava, ela mergulhava no enredo como quem, finalmente, tinha um lugar para descansar a alma.

Logo, estava sorrindo. O rosto que antes era sombra se tornou luz. As mãozinhas, antes fechadas, se abriram para brincar com o meu anel, como se ali estivesse a chave de uma nova esperança. A mãe, observando ao lado, parecia não acreditar: como uma história pode fazer mais do que tantas palavras de repreensão?

Foi então que percebi: talvez o que mais falte no mundo não sejam soluções complexas, mas gestos singelos. Contar uma história. Sentar-se junto. Ouvir sem pressa. Um colo pode ser mais terapêutico que qualquer remédio.

O planeta está doente, sim. Mas sua cura começa em pequenos sorrisos restaurados. Em cada criança que volta a brincar. Em cada adulto que se permite perdoar. Em cada família que reaprende a escutar. Não precisamos esperar milagres grandiosos: o milagre já está acontecendo quando alguém encontra amor em meio a confusão.

E enquanto a menina, corria pelo corredor com passos leves, senti dentro de mim uma certeza profunda: se quisermos um mundo novo, precisamos apenas lembrar que somos todos fiandeiros da mesma meada. E que cada gesto de amor é um ponto de costura no grande tecido da vida.
Pense nisso!



por Fernanda

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depois que a letra nasce
não há silêncio
há um choro que só eu ouço
e um medo que ninguém vê
o medo de mostrar demais
de sangrar diante de estranhos
de ser lida com desdém
ou pior: com pressa
porque parir palavras
é também deixar o peito aberto
num mundo que não sabe lidar
com quem sente fundo
a escrita respira fora de mim
e eu, nua, assisto
alguns dizem que é lindo
outros nem leem até o fim
há quem tente vestir meu poema
com a própria assinatura
como se dor fosse transferível
como se parto tivesse atalho
e é aí que mais dói
quando roubam o nome da minha filha
e fingem que nasceu de outra boca
quando arrancam o umbigo do texto
e dizem: “isso é meu”
não é
eu sei cada madrugada que ela levou
cada perda que empurrou esse verso
cada lágrima que virou frase
não quero aplauso
mas exijo respeito
porque minha escrita
anda no mundo com meu rosto
meus olhos, minha história
e quando alguém a toma como se fosse nada
está me dizendo:
“você também é nada”
mas eu sou tudo
o que ninguém teve coragem de escrever
e continuo parindo
mesmo ferida
porque escrever é a única forma
que conheço de sobreviver
(Fernanda)