Quando a noite chega,
tira os sapatos na porta
e entra em silêncio,
como quem não quer assustar ninguém.
Acende pequenas sombras
nos cantos da casa
e me chama para conversar
sobre o que ficou do dia.
Fala das dores com respeito,
coloca cada uma no colo
e sopra leve, até que pareçam menores
do que eu imaginava.
Depois, me mostra as estrelas
essas professoras antigas
que sabem tudo de paciência
e nada de pressa.
Encosta a testa na minha
e diz que o escuro também cura,
que há beleza no intervalo,
e que a alma cresce
justo quando o mundo recolhe.
Então eu fico quieta,
deixando a noite me ensinar
que nem tudo precisa ter resposta,
e que às vezes basta respirar
para que a vida volte a caber em mim.
Fernanda
Porque, no fim das contas,
comentar é apenas isso:
deixar o coração sentar um pouco ao lado das palavras.

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depois que a letra nasce
não há silêncio
há um choro que só eu ouço
e um medo que ninguém vê
o medo de mostrar demais
de sangrar diante de estranhos
de ser lida com desdém
ou pior: com pressa
porque parir palavras
é também deixar o peito aberto
num mundo que não sabe lidar
com quem sente fundo
a escrita respira fora de mim
e eu, nua, assisto
alguns dizem que é lindo
outros nem leem até o fim
há quem tente vestir meu poema
com a própria assinatura
como se dor fosse transferível
como se parto tivesse atalho
e é aí que mais dói
quando roubam o nome da minha filha
e fingem que nasceu de outra boca
quando arrancam o umbigo do texto
e dizem: “isso é meu”
não é
eu sei cada madrugada que ela levou
cada perda que empurrou esse verso
cada lágrima que virou frase
não quero aplauso
mas exijo respeito
porque minha escrita
anda no mundo com meu rosto
meus olhos, minha história
e quando alguém a toma como se fosse nada
está me dizendo:
“você também é nada”
mas eu sou tudo
o que ninguém teve coragem de escrever
e continuo parindo
mesmo ferida
porque escrever é a única forma
que conheço de sobreviver
(Fernanda)