Há uma força delicada que não se impõe, mas toca. Não é barulho, nem espetáculo. É brisa mansa que atravessa a alma e a faz estremecer de ternura. O nome dela é enternecimento.
O enternecimento nasce quando o coração se abre ao simples: o riso de uma criança, o olhar de um idoso que guarda histórias, a flor que insiste em nascer na rachadura do asfalto. Ele não exige nada, apenas nos lembra que, por trás da dureza da vida, há sempre algo de suave sustentando tudo.
É nesse estado de doçura que nos tornamos mais humanos. O enternecimento não enfraquece, ao contrário: fortalece o espírito porque nos devolve ao essencial. Quem se permite enternecer-se aprende a enxergar com os olhos de Deus, que nunca vê apenas defeitos, mas possibilidades; nunca olha apenas para a dor, mas também para a semente de luz escondida nela.
É preciso coragem para enternecer-se em um mundo tão duro. Coragem para não endurecer, para não reagir com frieza, para continuar escolhendo a ternura em vez do cinismo. Mas é justamente essa escolha que nos salva da indiferença.
Enternecer-se é permitir que a vida nos toque de dentro para fora. É aceitar ser sensível sem se sentir frágil, é acolher sem medir, é amar sem esperar retorno. É, enfim, lembrar que a alma tem raízes de luz.
E quando me enterneço, sinto que estou mais perto do coração divino.
Fernanda

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depois que a letra nasce
não há silêncio
há um choro que só eu ouço
e um medo que ninguém vê
o medo de mostrar demais
de sangrar diante de estranhos
de ser lida com desdém
ou pior: com pressa
porque parir palavras
é também deixar o peito aberto
num mundo que não sabe lidar
com quem sente fundo
a escrita respira fora de mim
e eu, nua, assisto
alguns dizem que é lindo
outros nem leem até o fim
há quem tente vestir meu poema
com a própria assinatura
como se dor fosse transferível
como se parto tivesse atalho
e é aí que mais dói
quando roubam o nome da minha filha
e fingem que nasceu de outra boca
quando arrancam o umbigo do texto
e dizem: “isso é meu”
não é
eu sei cada madrugada que ela levou
cada perda que empurrou esse verso
cada lágrima que virou frase
não quero aplauso
mas exijo respeito
porque minha escrita
anda no mundo com meu rosto
meus olhos, minha história
e quando alguém a toma como se fosse nada
está me dizendo:
“você também é nada”
mas eu sou tudo
o que ninguém teve coragem de escrever
e continuo parindo
mesmo ferida
porque escrever é a única forma
que conheço de sobreviver
(Fernanda)